RESUMO
A
finalidade essencial da presente monografia, será abordar a discussão
teórico-dogmática no que atine à impossibilidade de atribuir-se
responsabilidade penal à pessoa jurídica, uma vez que a esta resta evidente a
incapacidade de ação e culpabilidade, indispensáveis à configuração da
responsabilidade penal subjetiva. Dessa forma, o estudo aponta diversos óbices
à implementação e operacionalização da responsabilidade penal das pessoas
coletivas, porquanto incapazes, per si, de praticarem atos criminosos, senão
através de atos delitivos provenientes de seus dirigentes, representantes,
prepostos, enfim, daqueles que agem em seu nome, já que isso se constituiria
num pressuposto indispensável da aplicação de uma pena, a realização de um fato
típico, antijurídico e culpável que ditos entes morais não podem cometer, eis
que incapazes de ação no âmbito do Direito Penal. Ainda é abordada a situação
de países europeus que admitem tal instituto, bem como, das Américas. No
sistema penal brasileiro, constata-se um conflito de normas constitucionais
que, de um lado, constituem um sistema penal voltado para a responsabilidade
subjetiva e, de outro, mediante um artigo, dão ensejo à inserção da
responsabilidade objetiva, regulamentada através da Lei dos Crimes Ambientais
(Lei nº 9.605/98). No entanto, ao longo do presente trabalho verifica-se o
conflito entre ambas as responsabilidades, uma vez que tais medidas podem
violar preceitos sedimentados na Carta Magna e remetem à mantença e segurança
do próprio Estado Democrático de Direito.
Palavras Chave: responsabilidade –
penal – pessoa - jurídica, crime – ambiental.
SUMÁRIO
Introdução
|
01
|
Capítulo 1 |
|
Teoria Geral do Crime
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|
1.
Conceito
|
03
|
1.1Conceitos
Formais
|
04
|
1.2 Conceitos
Materiais
|
04
|
1.3 Conceitos
Analíticos
|
05
|
2. Fato Típico
|
07
|
2.1
Conduta
|
07
|
2.1.1 Teoria Causalista
|
08
|
2.1.2 Teoria
Finalista
|
08
|
2.1.3 Teoria Social da
Ação
|
09
|
2.2
Resultado
|
10
|
2.3 Nexo
Causal
|
10
|
2.4
Tipicidade
|
11
|
3.
Ilicitude
|
11
|
4.
Culpabilidade
|
12
|
4.1Imputabilidade
|
13
|
4.1.1 Potêcnical Consciência de
Ilicitude
|
14
|
4.1.2 Exigibilidade de Conduta
Diversa
|
15
|
Capítulo 2 |
|
Pessoa Jurídica |
|
1. Conceito
|
17
|
2. Natureza
Jurídica
|
18
|
2.1 Teoria da Ficção
|
18
|
2.2 Teoria Organica ou da Realidade
Objetiva
|
19
|
2.3 Teoria da Equiparação
|
20
|
2.4 Teoria da
Instituição
|
21
|
3. Responsabilidade Civil das Pessoas
Jurídicas
|
21
|
Capítulo 3 |
|
Crime Ambiental |
|
1. Conceito de Meio
Ambiente
|
23
|
1.1 Conceito Legal de Meio
Ambiente
|
24
|
2. Direito
Ambiental
|
25
|
2.1 Dos Princípios do Direito
Ambiental
|
30
|
2.1.1 Principio do ambiente
ecologicamente equilibrado como direito fundamental da
|
|
pessoa humana
|
31
|
2.1.2 Principio da natureza pública da proteção
ambiental
|
32
|
2.1.3 Principio do controle do poluidor pelo Poder
Público
|
32
|
2.1.4 Principio da consideração da variável ambiental no
processo decisório de políticas
|
|
de
desenvolvimento
|
32
|
2.1.5 Principio da participação
comunitária
|
33
|
2.1.6 Principio do poluidor
pagador
|
33
|
2.1.7 Principio da
prevenção
|
34
|
2.1.8 Principio da função sócio ambiental da
propriedade
|
34
|
2.1.9 Principio do direito ao desenvolvimento
sustentável
|
34
|
2.1.10 Principio da Cooperação entre os
povos
|
35
|
3. Crimes Ambientais, Lei 9605 de
12/02/1998
|
36
|
3.1 Sanções Aplicáveis à Pessoa Jurídica pela Lei dos
Crimes Ambientais
|
39
|
Capítulo 4 |
|
Responsabilidade Penal da
Pessoa Jurídica
|
|
1. Responsabilidade penal da pessoa jurídica, direito
comparado
|
41
|
1.1
Inglaterra
|
41
|
1.2 Estados
Unidos
|
42
|
1.3
França
|
43
|
1.4 América
Latina
|
44
|
1.5
Alemanha
|
45
|
1.6
Itália
|
46
|
1.7
Espanha
|
47
|
2. Responsabilidade penal da pessoa jurídica na
Constituição Federal de 1988
|
78
|
Considerações
Finais
|
53
|
Bibliografia
|
55
|
Introdução
O
desenvolvimento industrial, o progresso tecnológico, a urbanização desenfreada,
a explosão demográfica e a sociedade de consumo, entre outros fatores, têm
levado a um processo constante de degradação do meio ambiente, tendo a questão
econômica colidido frontalmente com a questão ambiental. Surgindo a necessidade
de equilíbrio entre as políticas econômicas e ambientais.
A
partir desse quadro, passa a ser reconhecida a necessidade da tutela
jurisdicional do meio ambiente, em diversas nações, com finalidade de controlar
as agressões a meio ambiente e preservar a natureza para as gerações presentes
e futuras.
Com
o advento da Constituição de 1988, o Brasil ingressa em um processo de
constitucionalização da tutela do meio ambiente, situação que já vinha
ocorrendo em outros países da América Latina e países Europeus. E como uma das
formas de controlar as agressões ao meio ambiente, diversas nações, adotam a
“Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica”, dentre estes o Brasil.
Posteriormente
esse dispositivo constitucional vem ser regulamentado pela Lei 9605/1998, que
reitera a questão da “Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica”.
Surge
então uma discussão entre a corrente que acredita que a Constituição foi
receptiva com relação a “Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica”, por trazer
essa possibilidade no artigo 225, parágrafo 3º, e outra que não houve essa
receptividade, pelo fato desses textos legais, artigo 225 da CF e a Lei
9605/1998 contrariarem as premissas do sistema penal vigente, voltado para a
responsabilidade subjetiva, que somente possibilita a “Responsabilidade Penal
da Pessoa Natural”.
Pertinente
se faz a discussão sobre este conflito existente entre sistema penal vigente e
a “Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica”, dessa forma, serão levantados os
pontos cruciais desse conflito, com relação à existência ou não da vontade
autônoma da pessoa jurídica e sua capacidade psíquica, e a relação dessas com
possibilidade ou não da imputação da “Responsabilidade Penal”, além de
discussão sobre as sanções penais que podem ser cominadas a esta, e ainda quais
premissas do sistema penal que podem ser violadas com essa responsabilização;
também será levantada a forma e possibilidade da “Responsabilidade Penal da
Pessoa Jurídica” em outros países e alterações implantas em alguns, para plena
efetividade dessa responsabilização.
CAPÍTULO 1
Teoria Geral do Crime
- Conceito
Não
é simples a tarefa de conceituar crime
de forma genérica, levando-se em conta as características comuns de todo e
qualquer crime. Tanto que ao longo dos anos, estudiosos do Direito Penal
discutiram o assunto em torno de concepções opostas, com finalidade encontrarem
a adequada conceituação de crime. Tem-se procurado definir o ilícito penal sob
três aspectos diversos. No aspecto externo, puramente nominal do fato, obtém-se
uma definição formal; já observando o
conteúdo do fato punível, consegue-se uma definição material; e examinando as características ou aspectos do crime,
chega-se a um conceito, também formal, mas analítico
da infração penal.
1.1.
Conceitos formais
Esta
conceituação aborda tão somente a aparência externa, da exteriorização do
crime, sob este aspecto formal, pode-se citar o conceito de CARMIGNANI “crime é
o fato humano contrário a lei[1]”,
além de GIUSEPPE MAGGIORE, segundo o
qual “Crime é qualquer ação legalmente punível[2]”
ou, com HELENO CLÁUDIO FRAGOSO ao afirmar que “toda ação ou omissão proibida
pela lei sob a ameaça de pena[3]”
ou segundo MANOEL PEDRO PIMENTEL[4],
“uma conduta contrária ao Direito, a que a lei atribui uma pena”, para
FRANCISCO MUÑOZ CONDE, “é toda conduta que o legislador sanciona com uma pena[5]”.
Do
ponto de vista do conceito formal, crime é o comportamento humano, proibido
pela norma penal, ou, simplesmente a violação desta norma. Crime é tão somente,
aquilo que a lei considera como tal. Não penetra, em sua essência, seu
conteúdo, em sua matéria.
1.2.
Conceitos materiais
A
conceituação material tem em vista o bem protegido pela lei penal.
Para
GIUSEPPE BETTOL, crime “é todo fato humano lesivo de um interesse capaz de
comprometer as condições de existência, de conservação e de desenvolvimento da
sociedade[6]”,
para NORONHA “crime é a conduta humana que lesa ou expõe a perigo um bem
jurídico protegido pela lei penal[7]” e
para MANZINI “delito é a ação ou omissão, imputável a uma pessoa, lesiva ou
perigosa a interesse penalmente protegido, constituída de determinados
elementos e eventualmente integrada por certas condições, ou acompanhada de
determinadas circunstâncias previstas em lei[8]”.
Pelos
conceitos expostos, verifica-se que o legislador ao definir certo fato humano
como crime, deve, previamente, verificar se o mesmo lesiona bens jurídicos, ou
pelo menos expõem a sociedade a grave perigo de lesão, e se tais lesões são de
gravidade acentuada, de modo a serem proibidas sob ameaça da sanção criminal.
Ocorre,
no entanto que tais conceitos por um lado servem para limitar a atuação do
legislador, por outro são insuficientes e incompletos, pois nem todas as
condutas humanas consideradas criminosas, comprometem a condição de existência
da sociedade.
1.3.
Conceitos analíticos
O
conceito analítico de crime parte do geral para o particular, decompondo o
crime em suas características mais simples, extrai de todo e qualquer crime
aquilo que for comum a todos eles.
Comum
a todos os crimes está à presença do comportamento do homem, através de uma
ação ou omissão. No entanto nem toda ação ou omissão humana é considerada como
crime, por tratar na maioria das vezes de comportamentos lícitos, e mesmo
alguns sendo ilícitos, não são considerados crimes. Nesta última situação
pode-se tratar de um ilícito de natureza civil, cuja sanção é ressarcir,
indenizar ou cumprir qualquer outra obrigação de natureza civil.
Só
é considerado como crime o comportamento humano, que estiver previamente
definido como crime, consoante ao Principio da Legalidade e da Reserva Legal
(art. 5º, XXXXIX, da CF e art. 1º do CP).
A
definição do crime contida na lei penal recebe o nome de tipo. Sendo este a descrição de um comportamento proibido pela
norma penal, sob a ameaça de sanção penal. Para que aja crime é necessário que
o comportamento humano, corresponda ao descrito num tipo.
No
entanto, o comportamento humano descrito no tipo, pode ser autorizado por norma
penal permissiva justificante, situação que ocorre no artigo 128 do Código
Penal: “Não se pune o aborto praticado
por médico: I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante” e II do
mesmo artigo: “Se a gravidez resulta de
estupro e o aborto é praticado de consentimento da gestante, ou, quando
incapaz, de seu representante legal”. Quando o fato autorizado por norma
permissiva penal, embora seja típico, não é ilícito, não podendo se considerado
como crime.
Comumente,
ocorrem situações na sociedade, em que o comportamento humano se enquadra na
descrição de um tipo penal, também sendo considerado como ilícito penal, mas
não configura crime, por não ser culpável, situação que ocorre quando este
comportamento humano, tipificado e ilícito é executado por menor de 18 anos,
bem como pelo doente mental, pois ambos são penalmente incapazes. Outrora, quando
o crime é praticado sobre coerção, também exclui a culpabilidade.
Para
a configuração de crime, o comportamento humano, além de tipificado na norma
penal e ilícito, deve também ser culpável.
2.
Fato típico
Uma
das características necessárias para a configuração de crime é ser este um fato
típico, descrito como tal na lei penal. Para que um fato seja considerado tipo
penal, todos seus componentes e elementos estruturais devem ser igualmente
típicos.
São
elementos do fato típico, a conduta (ação ou omissão), o resultado, o nexo
causal e a tipicidade.
2.1.
Conduta
Sobre
este elemento do fato típico, em que a palavra ação, tem sentido amplo, que
abrange não somente fazer, mas também o não fazer o devido, através da omissão,
repousa divergência entre as mais acaloradas do Direito Penal. Tanto que para
tal conceituação divergem três teorias, que extravasam as discussões meramente
acadêmicas, alterando inclusive a orientação do Direito Penal, conforme teoria
aceita por determinado país.
2.1.1.
Teoria causalista
A
teoria causalista ou naturalista da ação, de ERNST VON BELING e VON LISTZ,
incorpora ao conceito de conduta, as leis da natureza.
“Para
a teoria causalista (naturalista, tradicional, clássica, causal-naturalista) a
conduta é o comportamento humano voluntário no mundo exterior, que consiste em
fazer ou não fazer. È um processo mecânico, muscular e voluntário (porque na é
um ato reflexo), em que se prescinde do fim a que essa vontade se dirige. Basta
que se tenha certeza que o agente atuou voluntariamente, sendo irrelevante o
que queria, para se afirmar que praticou a ação típica[9]”.
Segundo
está teoria, a vontade é causa da conduta e esta é a causa do resultado, ou
seja, a conduta é efeito da vontade e causa do resultado.
Para
os causalistas, basta a existência de voluntariedade do comportamento, bem como
a existência de nexo causal entre o comportamento humano e o resultado. Não há
qualquer valoração acerca do fim pretendido pelo agente. Para estes, a
finalidade não deve ser abordada no momento da análise da tipicidade do fato,
deve ser abordada no momento em que for verificar a culpabilidade.
2.1.2.
Teoria finalista
Adotada
atualmente pelo Código Penal Brasileiro, segundo está teoria, não se pode
dissociar a ação, está em sentido amplo podendo ser o fazer ou não fazer,
quando deveria fazer, da vontade do agente. Já que a conduta é precedida de um
raciocínio, que o leva a realizá-la ou não. Ou seja, conduta é o comportamento
humano, voluntário e consciente (doloso ou culposo) dirigido a uma finalidade.
Assim o dolo e a culpa fazem parte da conduta, dessa forma, se ausentes, o fato
é atípico.
O
dolo na teoria finalista, deixa de ser normativo e passa a ser natural,
passando a ter os seguintes elementos: consciência da conduta, consciência do
resultado, consciência do nexo causal e vontade realizar a conduta e de
produzir o resultado.
2.1.3.
Teoria social da ação
É
acrescentado a está teoria, a idéia de relevância social, dessa forma, a
conduta além de comportamento humano, voluntário e consciente, deve ter
relevante valor social, devendo ser questionado pelos requisitos do Direito e
não pelas leis naturais.
Para
verificar a tipicidade de uma conduta é indispensável conhecer além dos
aspectos causais e finalisticos, a valoração da sociedade em relação a este
comportamento humano. Sendo relevante, a conduta que fosse capaz de afetar o
relacionamento desse individuo com o meio social.
Nos
dizeres de MIRABETE, “as críticas feitas a essa teoria residem na dificuldade
de conceituar-se o que seja relevância social da conduta, pois tal exigiria um
juízo de valor, ético. Tratar-se-ia de um critério vago e impreciso que,
inclusive influiria nos limites da antijuricidade, tornando também
indeterminada a tipicidade”.
2.2.
Resultado
Segundo
a teoria naturalística, resultado é a
conseqüência da conduta humana voluntária, aquilo produzido por uma conduta
humana dolosa ou culposa, que causa uma modificação no mundo exterior. Tendo
está conduta uma relação de causalidade com está modificação.
O
artigo 13 do Código Penal nos diz que a existência de crime depende do
resultado. No entanto a lei prevê, crimes em que não ocorre modificação no
mundo exterior, como nos casos de injúria, ato obsceno entre outros. Nestes
casos deve-se buscar o conceito segundo a teoria jurídica ou normativa,
assim o resultado deve ser entendido como lesão ou perigo de lesão de um
interesse protegido pela norma penal.
2.3.
Nexo causal
O
conceito de causa não é jurídico, mas da natureza, sendo assim, nexo causal é a
relação natural de causa e efeito existente entre a conduta do agente e o
resultado dela decorrente.
“A relevância penal da causalidade
acha-se limitada pelo elemento subjetivo do fato típico, por ter o agente
querido o fato ou por ter dado causa ao resultado ao não tomar cautelas que
dela se exigia, ou seja, só pratica conduta típica quem agiu com dolo ou culpa[10]”.
O
nexo causal é fundamental para a configuração do crime, sendo que este somente
existe, quando o resultado é ligado pelo nexo causal à conduta praticada, seja
ação ou omissão, isto se tratando de crime material. Já no crime formal e nos
de mera conduta, não se exige o nexo causal, pois estes dispensam a existência
de resultado naturalístico.
2.4.
Tipicidade
Ao
enquadrar-se no tipo penal pré-existente, a conduta adquire o atributo da
tipicidade, ou seja, passa a ter relevância no mundo jurídico. A tipicidade
significa, assim, a adequação da conduta à norma. O tipo penal consiste na
norma abstrata, que descreve esta conduta lesiva à sociedade. O tipo é o
injusto abstratamente, que ainda está por acontecer, já descrito na norma. O
tipo não é a conduta, mas, sim, a previsão legal da conduta que fere a ordem
pública.
O
comportamento humano, exteriorizado através de uma conduta de ação ou omissão,
ao gerar um resultado sob a égide da tipicidade, configura, em regra, um crime.
É em regra, pois a antijuridicidade ou, simplesmente, ilicitude, está
relativamente suprida pelo fato típico. Ou seja, havendo um fato típico, há
indícios de crime, e assim não será somente se existir alguma causa de exclusão
de ilicitude, que são, nos termos do artigo 23 do Código Penal, a legítima
defesa, o estado de necessidade, o exercício regular do direito e o estrito
cumprimento do dever legal.
3.
Ilicitude
A
ilicitude, presumidamente está intrínseca a tipicidade, assim cometido um fato
típico, presume-se que este seja ilícito.
Segundo MIRABETE, “a
antijuricidade é a contradição entre uma conduta e o ordenamento jurídico. O
fato típico, até prova em contrário, é um fato que, ajustando-se ao tipo penal,
é antijurídico[11]”.
Cometido
o fato típico, presume-se que seja ilícito, a menos que presente no caso
concreto uma das causas excludentes de ilicitude, previstas em lei.
Havendo
a ocorrência de uma excludente de ilicitude, tratar-se-á de fato típico e
licito. O artigo 23 do Código Penal prevê quatro causas de excludente de
ilicitude, sendo:
I
– em estado de necessidade;
II
– em legítima defesa;
III – em
estrito cumprimento do dever legal ou no exercício regular de direito.
Além
das excludentes de ilicitude, previstas na parte especial do Código Penal,
também existem excludentes de ilicitude aplicáveis a determinados crimes
previstas na parte especial do mesmo código.
4.
Culpabilidade
A
culpabilidade interpreta-se sob dois aspectos: de um lado, é pressuposto para
aplicação da pena, ou seja, consiste na capacidade individual de responder pela
sanção penal. A outra forma de manifestação da culpabilidade diz respeito aos
elementos de aplicação e medição da pena. Nesta acepção, a culpabilidade
funciona, não como fundamento da pena, mas como limite desta, impedindo que a
pena seja imposta aquém ou além da medida prevista pela própria idéia de
culpabilidade, aliada, é claro, a outros critérios.
Ao
adotar a teoria finalista, o código penal brasileiro recepcionou a teoria
normativa pura da culpabilidade. O dolo e a culpa são excluídos da
culpabilidade e inseridos no tipo penal, enquanto a consciência da ilicitude é
desvinculada do dolo e analisada sob os ditames da culpabilidade. A
culpabilidade, desta forma, traz consigo três elementos, a saber: a imputabilidade,
a potencial consciência da ilicitude e a exigibilidade de conduta diversa.
Assim, a imposição de uma pena de caráter criminal exige a concorrência destes
três dados, na seqüência analisados.
4.1. Imputabilidade
A
imputabilidade diz respeito à possibilidade do agente de sofrer as sanções
penais tipificadas à conduta praticada. Com a imputabilidade se pretende
designar a capacidade psíquica de culpabilidade: "...para que se possa
reprovar uma conduta a seu autor, é necessário que ele tenha agido com um certo
grau de capacidade, que lhe haja permitido dispor de um âmbito de
autodeterminação. A capacidade psíquica requerida para se imputar a um sujeito
a reprovação do injusto é a necessária para que lhe tenha sido possível
entender a natureza de injusto de sua ação e que lhe tenha podido permitir
adequar sua conduta de acordo com esta compreensão da antijuridicidade."
Toledo menciona que a "imputabilidade é sinônimo de
atribuibilidade.". Cezar Roberto Bitencourt menciona que: "...sem
a imputabilidade entende-se que o sujeito carece de liberdade e de faculdade
para comportar-se de outro modo. Com o que não é capaz de culpabilidade, sendo
portanto, inculpável."
A
inimputabilidade, em conseqüência, consiste na ausência total da capacidade
criminal, característica diferente daqueles que possuem parcial capacidade,
pois, se o agente sofrer de desenvolvimento mental retardado, mas puder, ao
tempo da ação, ter a mínima noção do caráter ilícito do fato, lhe é imputada
uma sanção, mesmo que diminuída em seu quantum.
4.1.1 Potencial consciência
da ilicitude
Além
disso, é imprescindível que o sujeito tenha consciência da reprovabilidade de
sua conduta e, no momento do fato, lhe era absolutamente esperada outra,
diferente da escolhida e configuradora do crime.
Muñoz
Conde ensina que a conduta criminosa "quase
sempre vem acompanhada da consciência de que se faz algo proibido, sobretudo
quando o bem jurídico, protegido no tipo em questão seja um bem fundamental
para convivência, em cuja proteção tem sua razão de ser o Direito Penal".
A falta
de consciência da ilicitude, portanto, exclui a culpabilidade. Entretanto, dela
não pode se aproveitar a agente quando: a) teria sido fácil para ele, nas
circunstâncias, obter essa consciência com algum esforço de inteligência e com
os conhecimentos hauridos da vida comunitária de seu próprio meio; b)
propositadamente, recusa-se a instruir-se para não ter que evitar uma possível
conduta proibida; c) não procura informar-se convenientemente, mesmo sem má
intenção, para o exercício de atividades regulamentadas.
4.1.2 Exigibilidade de
conduta diversa
Exige-se
que o sujeito tenha uma conduta em conformidade com o ordenamento
jurídico-penal, ou seja, uma conduta não antijurídica. A contrário senso, em
situações nas quais não lhe pode o direito exigir tal conduta, está prevista a
inexigibilidade desta e que funciona como forma de exclusão de culpabilidade. A
exigência em fazer com que o agente tenha outra conduta em situações adversas
representaria uma situação desumana.
Neste
sentido, doutrina Muñoz Conde: "O direito não pode exigir comportamentos
heróicos, ou, em todo caso, não pode impor uma pena quando, em situação
extrema, alguém prefere realizar um fato proibido pela lei penal a ter que
sacrificar sua própria vida ou sua integridade física."
Encontram-se
positivadas no Código Penal causas que excluem, total ou parcialmente, a
culpabilidade: a) doença mental (art. 26 caput); b) desenvolvimento
mental incompleto ou retardado (art. 26 caput e § único); c) embriaguez
proveniente de caso fortuito ou força maior (art. 28, §§ 1ºe 2º); d) menoridade
(art. 27); e) erro de proibição (art. 21); f) coação moral irresistível (art.
22); g) obediência a ordem superior hierárquica (art. 22); h) descriminantes
putativas (art. 20, § 1º).
Os
itens "a" a "d" excluem a imputabilidade, o erro de
proibição refere-se à potencial consciência da ilicitude, enquanto os demais
itens excluem a culpabilidade por não ser exigível do sujeito outra conduta, se
não a que gerou o ilícito.
Portanto,
pelo estudo da culpabilidade conclui-se que o agente poderá ser punido quando é
passível de sanção penal e quando tiver livremente decidido pelo ilícito.
Evidencia-se,
assim, ser incontestável o argumento de que a pessoa jurídica não pode ser
sujeito ativo de crime, por não ser imputável, não possuindo capacidade
psíquica. Também não tem consciência alguma, seja lícita ou ilícita e mais, a
pessoa jurídica é desprovida de qualquer forma de conduta, incidindo o brocardo
nullum crimen sine conducta. Conforme prelecionam Zaffaroni e Pierangeli,
"quem quiser defender a vigência de
um direito penal que reconheça um mínimo de respeito à dignidade humana não
pode deixar de reafirmar que a base do delito – como iniludível caráter
genérico – é a conduta”.
CAPÍTULO 2
Pessoa Jurídica
1.
Conceito
As
pessoas jurídicas, também chamadas de pessoas
morais (no direito francês) e pessoas
coletivas (no direito português) e que podem ser definidas como associações
ou instituições formadas para a realização de um fim e reconhecidas pela ordem
jurídica como sujeitos de direito.
O
homem, isoladamente é pequeno para a realização de grandes empreendimentos.
Desde cedo percebeu a necessidade, de unir-se a outros homens, para realizar
determinados empreendimentos. Desta forma, surge a pessoa jurídica, a partir de uma vontade humana criadora. Há uma
pluralidade inicial de membros que, por sua vontade se transforma numa unidade,
na pessoa jurídica, que futuramente
passará a existir como ente autônomo, cuja vontade é diversa da vontade de seus
membros – societas distat a singulis – havendo
a personificação do ente coletivo, na forma abstrata.
“Para bem compreender a existência de semelhantes entidades de pessoas
jurídicas, é preciso partir da idéia de que o indivíduo, muitas vezes, por si
só, será incapaz de realizar certos fins que ultrapassam suas forças e os
limites da vida individual. Para consecução desses fins, ele tem de unir-se a
outros homens formando associações, dotadas de estrutura própria e de
personalidade privativa, com as quais supera a debilidade de suas forças e a
brevidade de suas vida[12]”.
Embora
nasçam da vontade humana, as pessoas jurídicas, se tornam impessoais,
insensíveis e fazem dos homens que certo dia a instituíram, meras peças que
podem ser substituídas conforme os interesses desta.
2. Natureza jurídica
É
polêmica a conceituação da natureza da pessoa
jurídica, dela tendo-se ocupado juristas de todas as épocas e de todos os
campos do Direito, sedo banhada de posições políticas, religiosas, sociológicas
e filosóficas.
Várias
teorias foram formuladas a respeito: teoria da ficção, teoria orgânica ou da
realidade objetiva, teoria da equiparação e teoria da instituição.
2.1. Teoria da ficção
Originou-se
no direito canônico e prevaleceu até o século passado. Para os adeptos dessa
teoria, os direitos são prerrogativas concebidas apenas ao homem nas relações
com seus semelhantes. Tais prerrogativas humanas pressupõem vontade capaz de
deliberar, assim como poder de ação. Por isso só o homem pode ser titular de
direitos, porque só ele tem existência real e psíquica. A pessoa jurídica é criação artificial da lei para exercer direitos
patrimoniais; é pessoa puramente pensada.
Esta
teoria é sustentada por SAVIGNY, para quem a pessoa jurídica não existe senão na abstração, sendo puro ato de
espírito, é pessoa imaginária, sem qualquer realidade, sem qualquer
objetividade, simples projeção.
Para
IHERING, a pessoa jurídica não é se não um sujeito aparente, um expediente
técnico, que oculta os verdadeiros sujeitos, que são sempre os homens.
Uma
das mais sérias críticas feitas a essa teoria refere-se à personalidade do
Estado, ela não cuidou de explicar a existência do Estado como pessoa jurídica. Dessa forma o próprio
direito será uma ficção, porque emana do Estado. Ficção será, portanto, tudo
que se encontre na esfera jurídica, inclusive a própria teoria da pessoa jurídica.
2.2. Teoria orgânica ou da realidade objetiva
Esta
teoria parte de base oposta a teoria da ficção. Pessoa não é só o homem, junto
deste há entes dotados de existência real, tão real quanto das pessoas físicas,
que são as pessoas jurídicas. Além da pessoa natural, como organismo físico,
também há organismos sociais, que tem vida autônoma e vontade própria.
No
entanto, recai na ficção quando se refere à vontade própria da pessoa jurídica.
A vontade é peculiar aos homens, como fenômeno humano não pode existir num ente
coletivo.
Entre
duas posições antagônicas (teoria da ficção e teoria da realidade), interpõe-se
a realidade técnica ou jurídica e que fornece a verdadeira essência jurídica da
pessoa jurídica.
“Sendo eclética ela reconhece que há
uma parcela de verdade em cada uma daquelas teorias. Do ponto de vista físico e
natural, só a pessoa física é realidade. Sob esse aspecto, portanto a pessoa
jurídica não passará de ficção[13]”.
A
pessoa jurídica tem uma realidade, não física, mas realidade jurídica, ideal, a
realidade das instituições jurídicas. Tendo no âmbito do direito o mesmo
subjetivismo outorgado as pessoas físicas.
2.3.
Teoria da equiparação
Está
teoria propõe que as pessoas jurídicas
são patrimônios equiparados, no seu tratamento jurídico, às pessoas naturais.
Sendo que a pessoa jurídica não passa
de mero patrimônio destinado a um fim específico, ou patrimônio personificado
pelo direito. Tal teoria confunde a pessoa
jurídica com o patrimônio da pessoa física.
2.4. Teoria da instituição
Segundo
essa corrente, existe na realidade social uma série de realidades
institucionais que se apresentam na forma de uma estrutura hierárquica. A vida
interior da pessoa jurídica revela-se por meio de seus órgãos diretores e ao
exercer uma atividade exterior, a pessoa age como pessoa jurídica.
Uma
instituição da à idéia de obra, de empresa que se desenvolve, realiza e
projeta, dando forma definidas a fatos sociais. Quando está idéia permite
unificar a atuação dos indivíduos de tal modo que essa atuação se manifeste
como exercício de poder juridicamente reconhecido, a instituição adquire a
personalidade jurídica.
3. Responsabilidade civil das pessoas jurídicas
O
Código Civil prevê, explicitamente, nos artigos 186, 187 e 927, a obrigatoriedade da
reparação dos danos porventura causados por aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a
outrem. Decorre do princípio geral de que ninguém deve prejudicar os outros, alterum
nom laedere. O parágrafo único do artigo 927 estabeleceu a obrigatoriedade
de ressarcimento independente de culpa, nos casos previstos em lei, quando
observados o nexo de causalidade entre o fato ocorrido e a lesão sofrida, o que
se denominou de “responsabilidade objetiva”. Essa responsabilidade funda-se na
teoria do risco decorrente do exercício de atividade lícita, mas com potencial
para causar dano. Resulta da ponderação de valores para a aplicação da justiça
e da segurança, quando se confrontam os interesses individuais e os coletivos.
A
responsabilidade civil se limita ao ressarcimento dos danos, sendo a
indenização estabelecida pela sua extensão, conforme artigo 944 do Código
Civil. A sanção visa, desta forma, restituir a integridade do direito lesado,
então, observado um dano por violação a um dever jurídico, o delito fica
caracterizado.
Na
questão ambiental, a responsabilidade civil da pessoa jurídica se baseia na
teoria do risco da atividade. Assim, independente de culpa, o exercício de
atividade, com ou sem fins lucrativos, mesmo que não perigosa, mas que venha a
provocar dano ao meio ambiente, é fundamento para a reparação dos prejuízos
causados, desde que provado o nexo de causalidade. Visa a responsabilidade
civil pela indenização, a recomposição do bem lesado, atribuindo-se a reparação
civil tanto à pessoa física como à jurídica.
CAPÍTULO 3
Crime Ambiental
1.
Conceito de meio ambiente
Os
vocábulos, meio ambiente indicam algo
periférico, ou seja, algo que está ao redor ou em torno de um centro[14].
Entretanto não há como conceituar meio ambiente sem compreender o que
constitui. O meio ambiente é formado por terra, água, luz, etc. e, sem dúvidas
pelo ser humano[15]. O
homem assim como qualquer espécie viva de que se tenha conhecimento, na existe
fora do mio ambiente. Toda a vida que se tem conhecimento hospeda-se na Terra,
na natureza, no que se pode chamar de meio ambiente.
Dessa forma, pode-se conceituar o
meio ambiente como sendo o local, ou o espaço, onde há condições para que a
vida se desenvolva.
Nas palavras de COIMBRA, este
conceitua meio ambiente sendo:
“conjunto do elementos abióticos (físicos e químicos) e bióticos (flora e
fauna), organizados em diferentes ecossistemas naturais e sociais em que se
insere o homem, individual e socialmente, num processo de interação que atenda
ao desenvolvimento das atividades humanas, à preservação dos recursos naturais
e das características essenciais do entorno, dentro das leis da natureza e de
padrões de qualidade definidos”.
1.1 Conceito legal de meio ambiente
A Lei 6.938/1981 que dispõe sobre a
Política Nacional do Meio Ambiente, define em seu artigo 3º, inciso I, sendo
meio ambiente:
“o conjunto de condições, leis, influências, e interações de ordem física, química e
biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”.
Para FIORILLO, é pacífico o
entendimento de que o referido conceito foi recepcionado pela Constituição
Federal de 1988, que buscou tutelar não somente o meio ambiente natural,
abrangendo o meio ambiente artificial, de trabalho e cultural. O mesmo autor
ensina que, “a definição de meio ambiente
é ampla, devendo-se observar que o legislador optou por trazer um conceito
jurídico indeterminado, a fim de criar espaço positivo para a incidência da
norma”.
2.
Direito ambiental
A
destruição do meio ambiente é sem dúvida um dos mais graves problemas que a
humanidade enfrenta desde a segunda metade do século XX até os dias atuais,
problema que não põe só em risco a conservação deste, mas sim a sobrevivência
da própria a humanidade.
Preocupação que tem se alastrado por
todos os países e por organismos internacionais. O informe sobre a Situação
Social da ONU (Organização das Nações Unidas), de 1982, destacou que “há
algumas grandes esferas de preocupação que são comuns a todos os países, tais
como a contaminação que alcança níveis perigosos na água, no ar, no solo e nos
seres vivos; a necessidade urgente de conservar os recursos naturais não
renováveis; as possíveis perturbações do equilíbrio ecológico da biosfera,
emergentes da relação do homem com o meio ambiente, e as atividades nocivas
para a saúde física, mental e social do homem no meio ambiente por ele criado,
particularmente no ambiente de vida e de trabalho”.
O desenvolvimento industrial, o
progresso tecnológico, a urbanização desenfreada, a explosão demográfica e a
sociedade de consumo, entre outros fatores, têm levado a um processo constante
de degradação do meio ambiente. Tendo a questão econômica colidido frontalmente
com a questão ambiental, surge então a necessidade do equilíbrio entre as
políticas ambientais e econômicas, procurando equilibrar a industrialização e
desenvolvimento, com a proteção e revitalização do meio ambiente. Trata-se, na
verdade, de optar por um desenvolvimento econômico qualitativo, não obstante a
questões ambientais, capaz de propiciar uma real elevação da qualidade de vida
e bem-estar social. Neste sentido, a Declaração de Estocolmo, no Principio 13,
recomenda que:
“a fim
de obter uma mais racional ordenação dos recursos e melhorar assim as condições
ambientais, os Estados deveriam adotar um enfoque integrado e coordenado de
planificação de seu desenvolvimento, de modo que fique assegurado a
compatibilidade do desenvolvimento com a necessidade de proteger e melhorar o
meio humano em beneficio de sua população”.
Ante
este quadro de degradação, passa a ser reconhecida a necessidade a tutela
jurisdicional do meio ambiente em diversos nações, com a finalidade da
preservação da natureza para o presente e gerações futuras. Passando a ser
consagrado entre os direitos fundamentais, mais especificamente entre o direito
a vida e a saúde.
Na
Declaração de Estocolmo em 1972, se verifica profunda preocupação com o meio ambiente
e sua relação com o homem, consagrando em sua resolução final que:
“o homem é ao mesmo tempo criatura e criador do meio ambiente que lhe dá
sustento físico e lhe oferece oportunidade de desenvolver-se intelectual,
moral, social e espiritualmente. A longa e difícil evolução da raça humana no
planeta levou-a a um estágio em que, com o rápido progresso da ciência e da
tecnologia conquistou o poder de transformar de inúmeras maneiras e em escalas
sem precedentes o meio ambiente. Natural ou criado pelo homem, é o meio
ambiente essencial para o bem estar e para o gozo dos direitos humanos
fundamentais, até mesmo o direito à própria vida”.
A
legislação ordinária francesa, de forma prolixa passa a legislar a respeito,
através da Carta da Água, de 1964; Carta Rural, em seu artigo 434, mas foi com
a Lei de Proteção da Natureza de 1976, que a França passa a reconhecer o meio
ambiente, como finalidade geral. Sendo o enunciado do artigo 1º desta lei:
“a proteção dos espaços naturais e das paisagens, a preservação das
espécies animais e vegetais, a manutenção dos equilíbrios biológicos nos quais
eles participam e a proteção dos recursos naturais contra todas as causas de
degradação que os ameaçam são de interesse geral”.
No mesmo sentido a Lei Fundamental
Alemã, de 1949, também trata diretamente do assunto. Na Itália, a Constituição
de 1947 prevê a “tutela sobre a paisagem,
do patrimônio histórico e artístico da nação”. Sendo, paisagem interpretada
em sentido extensivo, abrangendo não somente a conservação das belezas
naturais, mas sim, todo o território criado pela comunidade onde se encontra
inserida, como continua interação entre a natureza e o homem, como forma de
ambiente, e por isso volta a tutela do mesmo ambiente natural modificado pelo
homem. A constituição do Chile, de 1972, assegura a todos um meio ambiente
livre de contaminação, sendo dever do Estado, velar para que este direito na
seja transgredido e tutelar a preservação da natureza, podendo a lei
estabelecer restrições especificas ao exercício de determinados direitos ou
liberdades para proteger o meio ambiente. No mesmo sentido, outros países das
Américas passaram a tutelar o meio ambiente, como a Constituição de Cuba, de
1973 (artigo 27), do Panamá, de 1972 (artigos 114 e 117), do Peru, de 1980 (artigo
123), El Salvador, de 1983 (artigo 117), da Guatemala, de 1985, (97) e do
México, de 1987 (artigo 27).
O Brasil, na Constituição de 1988,
não ficou indiferente a esse processo de constitucionalização, da tutela do
meio ambiente. Tendo o legislador constituinte, buscado inspiração nas
Constituições da Grécia, de 1975; de Portugal, de 1976; e da Espanha, de 1978.
O Brasil, na Constituição Federal de
1988, no artigo 225, define o meio ambiente ecologicamente equilibrado como
direito de todos e lhe dá a natureza de bem de uso comum do povo e essencial à
sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever
de defendê-lo e preserva-lo para as presentes e gerações futuras. O parágrafo
1º, bem como seus incisos do referido artigo, arrola as medidas e providencias
que incumbem ao Poder Público tomar para assegurar a efetividade do direito
reconhecido no caput, vejamos;
Art. 225. Todos têm direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial
à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever
de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
I - preservar e restaurar os processos ecológicos
essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e
fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material
genético;
III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus
componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão
permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a
integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo
prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e
substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio
ambiente;
VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a
conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que
coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou
submetam os animais a crueldade.
§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio
ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público
competente, na forma da lei.
§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente
sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e
administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o
Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua
utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a
preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por
ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.
§ 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização
definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.
A Constituição de 1988 está alinhada
com uma nova ordem jurídica que contenha mecanismos capazes de proporcionar um
meio ambiente equilibrado, que proporcione uma melhor qualidade de vida e de
bem-estar social.
A alusão ao meio ambiente em nossa
constituição dever ser entendida de forma ampla, incluindo além dos recursos
naturais existentes na biosfera (ar, água, solo, fauna e flora), e a relação do
homem junto a esses elementos, visando lhe permitir condições de vida
satisfatória.
Como forma de garantir, um meio
ambiente equilibrado, o legislador constituinte, trouxe uma inovação prevista
no parágrafo 3º, do artigo 225, em que traz expressamente a cominação de
sanções penais e administrativas, a pessoas físicas ou jurídicas, que venham a
causar lesão ao meio ambiente, desta forma, não se limitando a uma tutela
formal.
Pode-se dizer que o texto
constitucional em vigor, traz uma tutela ao meio ambiente de forma completa,
dentro de toda a amplitude possível a essa expressão, tutelando o meio
ambiente, de forma a protegê-lo, dentro de todas as formas jurídicas possíveis.
2.1 Dos Princípios do direito
ambiental
Como não poderia
deixar de ser, o Direito Ambiental é o conjunto de normas que controlam de
forma coercitiva as atividades relacionadas ao meio ambiente, visando a
preservação ambiental, tanto para a geração atual, como para as futuras
gerações, buscando equalizar, conscientizar e fiscalizar as atividades da
sociedade como um todo, trazendo consigo a punibilidade para aqueles que venham
a desrespeitar tais normas.
Como em qualquer
ramo do direito, e conforme o valor axiológico que os fatos ambientais nos
trazem como experiência jurídica, há um conjunto de princípios que regem o
direito ambiental, sendo estes a base fundamental, ou estrutura central na qual
as normas são construídas. Deve, entretanto ficar claro que os princípios do
direito ambiental, sempre caminharão em conformidade com os princípios de
outros ramos do direito, e nem poderia estar apartado, pois, uma vez fazendo
parte do nosso ordenamento jurídico, deve fortalecer nossa estrutura normativa,
firmando assim a unicidade e coerência do mesmo.
Pois bem, em vista
do exposto, podemos enumerar e explanar sobre os princípios do Direito
Ambiental, conforme seguem.
2.1.1 Princípio
do ambiente ecologicamente equilibrado como direito fundamental da pessoa
humana
Ao falarmos sobre
direitos fundamentais da pessoa humana, lembramo-nos de pronto do artigo 5° da
Constituição Federal. Seu caput diz:
“Todos são iguais perante a lei,...
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade...”. Aqui, e os incisos seguintes descrevem com detalhes, o
Estado assume a responsabilidade primaria de garantir a todos, um ambiente
digno, buscando satisfazer as suas necessidades básicas.
Em adição, e de
forma muito capaz, o artigo 225, nos traz um complemento fundamental a esses
direitos, como podemos destacar seu caput,
em que declara que “Todos têm direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial
à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever
de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Temos agora, e
principalmente partir dos movimentos em favor do meio ambiente, como o Encontro
Rio (1992), Conferência da ONU (1972) e pela Carta da Terra (1997),
incorporado, ainda que forma ainda a ser aprimorada, o direito a um meio
ambiente equilibrado, garantindo portanto, a qualidade de vida, protegendo a
todos contra os abusos ambientais de qualquer natureza. Conforme Milaré
destaca, temos, a partir desse artigo 225, este principio como sendo
transcendental das clausulas pétreas.
2.1.2 Princípio da
natureza pública da proteção ambiental
Ao falarmos sobre direito ambiental, em face do artigo 225, estamos falando sobre um direito que é estendido a todos, sendo portanto, de interesse público. Disso importa dizer que, a todos pertence o direito de usufruir, bem como a obrigação de respeitar o meio ambiente, sendo defeso a qualquer individuo, a prerrogativa de usufruir deste particularmente, respeitando o brocado “in dúbio pro ambiente”. Com isso, deixamos claro que temos aqui configurado, um direito indisponível, por fazer parte das clausulas pétreas.
Ao falarmos sobre direito ambiental, em face do artigo 225, estamos falando sobre um direito que é estendido a todos, sendo portanto, de interesse público. Disso importa dizer que, a todos pertence o direito de usufruir, bem como a obrigação de respeitar o meio ambiente, sendo defeso a qualquer individuo, a prerrogativa de usufruir deste particularmente, respeitando o brocado “in dúbio pro ambiente”. Com isso, deixamos claro que temos aqui configurado, um direito indisponível, por fazer parte das clausulas pétreas.
O Estado, visando à proteção coletiva,
deve, através de seus institutos, agirem, inclusive de forma coercitiva,
visando alcançar objetivo de levar qualidade de vida a todos.
2.1.3 Princípio
do controle do poluidor pelo Poder Público
Como já dito, cabe
ao Estado, através das polícias administrativas, fiscalizar e orientar os
particulares quanto aos seus limites em usufruir o meio ambiente. Desta forma,
é empregado, principalmente de forma educativa, infra-estrutura e tecnologias
com o intuito de conscientizar sobre a importância de observar sempre o
coletivo, nunca o individual. Todo esse trabalho é feito em observância ao
artigo 225, CF.
2.1.4 Princípio
da consideração da variável ambiental no processo decisório de políticas de
desenvolvimento
Tendo em vista o
impacto em nosso meio de cada decisão tomada tanto publica quanto privada, este
principio, consagrado a partir do final dos anos 60, versa sobre a obrigação,
de analisar as variáveis ambientais, respeitando com isso, o inciso V, do
parágrafo 1°, do artigo 225 (status constitucional). Isso porque, dependendo da
decisão, pode haver impacto negativo para o meio. Somente a guisa de histórico,
esse principio, em nível internacional, foi ratificado pela Declaração do Rio
de Janeiro, em seu principio 17.
2.1.5 Princípio
da participação comunitária
Segundo este
princípio, que não é aplicado somente no direito ambiental, para que sejam
instituídas políticas ambientais, bem como os assuntos discutidos de forma
salutar, é fundamental a cooperação entre o Estado e a comunidade. E o sucesso
nos resultados demonstra que tanto a população quanto a força sindical tem se
envolvido ativamente em definir e realinhar tais políticas. Esse princípio está
calcado o caput do artigo 225, bem como objeto o princípio 10 da Declaração do
Rio de Janeiro. Além disso, está ligado ao direito à participação, pois aqueles
da sociedade que têm acesso às informações, podem disseminá-las, articulando
assim soluções plausíveis, principalmente porque este assunto os interessa
pessoalmente.
2.1.6 Princípio
do poluidor pagador
Neste priníipio, os
agentes econômicos devem contabilizar o custo social da poluição por eles
gerada, e este deve ser assumido, ou internalizado. Isso acontece porque, junto
com o processo produtivo, também são produzidas externalidades negativas. Dá-se
esse nome pelo fato de que os resíduos da produção, que são recebidos pela
coletividade, enquanto o lucro é recebido somente pelo produtor. Não se deve
confundir este princípio como licença para poluir, pois o ônus para o poluidor,
tem caráter punitivo, para que crie a consciência de que o meio ambiente deve
ser preservado, inclusive no processo de produção e desenvolvimento.
2.1.7 Princípio
da prevenção
Édis Milaré, define com destreza este
principio: “O principio da prevenção é
basilar o Direito Ambiental, concernindo à prioridade de que deve ser dadas as
medidas que evitem o nascimento de atentados ao ambiente, molde a reduzir ou
eliminar as causas de ações suscetíveis de alterar a sua qualidade.” Isso
vale dizer que, segundo este principio, as possíveis ações danosas ao meio
ambiente devem ser identificadas e eliminadas antes de se concretizarem, em
proteção a sociedade atual e futura.
2.1.8 Princípio
da função sócio ambiental da propriedade
A propriedade,
conforme a constituição atual deve cumprir com sua função social (art. 128 §
2°, cf.). Alem dessa função social, podemos destacar ainda, a função ambiental
que a propriedade deve ter, em preservar a flora, fauna, belezas naturais,o
equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitar a
poluição do ar e das águas.
A partir destas informações, deve
haver um controle por parte do Estado, havendo, no caso de desobediência a
estas normas e a este princípio, sansão no usufruto da propriedade, ate que a
situação seja ajustada e o meio ambiente seja protegido.
2.1.9 Princípio
do direito ao desenvolvimento sustentável
Sustentabilidade
quer dizer, usufruir protegendo. Isso vale dizer que, há aqui ao mesmo tempo um
direito, o de usufruir, e uma obrigação, a de preservar. Durante um longo tempo
na historia, o homem tem usufruído o meio ambiente sem se preocupar com as
futuras gerações. Hoje temos como conseqüência o efeito estufa, chuva ácida,
poluição dos rios, mares e outros problemas, por não haver tal preocupação com
o crescimento sustentável. Com esse intuito, a agenda 21 de 1992 veio a ter
como meta buscar o respeito de todos os paises a este principio tão importante
para a continuidade de nossa espécie humana, que é de nossa responsabilidade.
Responsabilidade esta, que engloba dirimir o desperdício, consumo desordenado,
bem como desrespeito a todos os recursos disponíveis.
2.1.10 Princípio
da Cooperação entre os povos
Este princípio
trata do fato de que não há em nenhum outro assunto, tanta interdependência
entre os paises quanto este do meio ambiente. Por exemplo, a chuva ácida
provocada pela indústria química nos EUA atingiu o Canadá, e a poluição do mar
pode ser levada a milhares de quilômetros, atravessando vários paises.
Assim sendo, há
necessidade cada vez maior que haver integração, ou cooperação entre todos os
povos, a fim de realmente discutir o assunto meio ambiente, criar políticas
ambientais, resolver problemas desta ordem, bem como disseminar a cultura de
proteção a todo custo do meio ambiente. Desde 1972, com a 1ª Conferencia
Mundial de Estocolmo, essa necessidade tem chamado a atenção tanto de governos
como de grandes organizações econômicas. Porém, ainda temos políticas muito
jovens, necessitando portanto que haja disseminação em todos os pólos das
sociedades, para que este princípio possa ser aplicado no sentido amplo.
3. Crimes Ambientais, Lei 9605 de
12/02/1998
É inquestionável que a Lei 9.605, de
12 de fevereiro de 1998, empreendeu uma abordagem mais eficaz quanto à tutela
do meio ambiente, já que as leis ambientais brasileiras anteriores, hoje em
parte vigorantes, constituíam-se em um arrazoado desconexo, imperfeito e não
passível de codificação. PRADO sintetiza exemplarmente o estado das leis
ambientais pretéritas à Lei em comento:
As Leis Penais Ambientais, mormente no Brasil, são, em sua maioria,
excessivamente prolixas, casuísticas, tecnicamente imperfeitas, quase sempre
inspiradas por especialistas do setor afetado, leigos em Direito, ou quando
muito de formação jurídica não específica, o que as torna de difícil aplicação,
tortuosas e complexas, em total descompasso com os vetores –
técnico-científicos – que regem o Direito Penal Moderno.
Não questiona a
doutrina, a importância da aludida lei como instrumento de controle das
agressões ao meio ambiente. A realidade ambiental sempre exigiu, e hoje, a teor
do bem jurídico protegido, com mais urgência ainda, uma normatização jurídica
mais rígida e eficaz. Neste aspecto, quanto à pessoa física, andou bem a lei, ainda
que tardiamente.
Entretanto,
segundo a doutrina, a mesma eficácia poderia ser obtida sem que se socorresse
do Direito Penal, pois o ordenamento jurídico oferece uma gama de sanções de
outras naturezas, quer de Direito civil, quer de Direito administrativo que, na
maioria das vezes, são bem mais eficazes na proteção dos bens jurídicos do que
a tutela penal. Lembre-se da questão da ultima
ratio do Direito penal.
A vigência do
princípio societas delinquere non potest
não obsta ou inviabiliza a necessária aplicação de medidas sancionadoras
extrapenais, de ordem administrativa ou civil, às pessoas jurídicas. Aliás, é a
preocupação com a grande intervenção dos entes coletivos em atividades
delituosas em certas áreas como a do meio ambiente, a do consumidor, a da
economia, etc, que faz com que o ordenamento jurídico ofereça previsão para a
efetiva aplicação de sanções extrapenais (v.g.
Lei 4.728/65, 4.729/65, Lei 7.492/86, Lei 5.197/67, Dec.-Lei 16/66, a própria
Lei 9.605/98 e tantas outras). Basta aplicá-las adequadamente.
Quanto à técnica
legislativa, não se pode negar, também, que o legislador pátrio teve como fonte
de inspiração o modelo francês, recentemente adotado pelo Código Penal (art.
121-2), em vigor desde 1º de março de 1994: as pessoas morais, com exceção do Estado, são penalmente responsáveis,
segundo as distinções dos artigos 121-4 a 121-7 e nos casos previstos em lei ou
regulamento, pelas infrações praticadas por sua conta, pelos seus órgãos ou
representantes.
Ainda que adequada
a escolha do paradigma, visto ser o Direito francês escrito, e pertencente à
família romano-germânica, não andou bem nosso legislador em sua formulação. É
que na França, tomou-se o cuidado de adaptar-se de modo expresso essa espécie
de responsabilidade no âmbito do sistema tradicional. A denominada Lei de
Adaptação (Lei 92-1336/1992) alterou inúmeros textos legais para torná-los
coerentes com o novo Código Penal, contendo inclusive, disposições de processo
penal, com intuito de harmonização processual, particularmente necessária com a
previsão da responsabilidade penal da pessoa jurídica.
Com o Brasil,
deu-se exatamente o oposto. O legislador, de forma simplista, nada mais fez do
que enunciar a responsabilidade penal da pessoa jurídica, cominando-lhe penas,
sem, contudo, adaptar a nova intervenção aos postulados (centenários,
inclusive) do sistema já posto.
Na concepção de
BACIGALUPO, a simples introdução no
ordenamento jurídico de uma norma prevendo a responsabilidade penal da pessoa
jurídica não será a solução, enquanto não se determinar, previamente, os
pressupostos de dita responsabilidade.
Com efeito, a
recepção legal deve ser a culminação de todo um processo, onde devem estar
muito claros os pressupostos de aceitação da pessoa jurídica como sujeito de
Direito penal e os respectivos pressupostos dessa imputação, para não se
avultar a hipótese de inserção de responsabilidade objetiva no sistema penal.
Isso significa, na
esteira daqueles que não vêem consagrada a responsabilidade penal da pessoa
jurídica na Constituição Federal de 1988, que dita disposição normativa não se
constitui passível de aplicação concreta e imediata, pois faltam-lhe
instrumentos hábeis e indispensáveis para a consecução de tais fins.
Não é, como disse
BACIGALUPO, uma simples inserção normativa que irá romper séculos de estudos e
conquistas científicas, que culminaram em princípios fundamentais como o
Direito penal mínimo, ou o da irresponsabilidade criminal da pessoa jurídica,
este ancorado, solidamente, no sistema de responsabilidade da pessoa natural, sem
o fornecimento, contudo, de elementos básicos e específicos conformadores e
adaptadores de um novo microssistema penal.
Nas ciências
humanas principalmente, as modificações e as inovações não se revelam do dia
para noite, como que de repente. Trata-se, sobretudo, de atendimento às linhas
evolutivas de uma ciência, constantes em uma determinada época, para auferir
delas as transformações, no caso, jurídicas, aptas a proporcionar à sociedade
um reflexo mais fiel possível de seu estágio atual de consciência, se é que
podemos pensar em uma consciência social.
3.1 Sanções Aplicáveis
à Pessoa Jurídica Pela Lei dos Crimes Ambientais
Tanto
a Constituição Federal como o Código Penal prevêem modalidades de penas
aplicáveis à pessoa física. Relativamente à pessoa jurídica, a Lei dos Crimes
Ambientais adotou, no artigo 21,
a pena de multa, a restritiva de direitos e a prestação
de serviços à comunidade. As penas restritivas de direitos, nos termos do
artigo 22, foram divididas em: suspensão parcial ou total de atividades,
interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade e proibição de
contratar com o Poder Público, bem como dele obter subsídios, subvenções ou
doações. Além destas sanções, está prevista, no artigo 24, a liquidação forçada da
empresa, nos casos especiais ali elencados.
Uma
análise cuidadosa revelará que as penas efetivamente aplicáveis às pessoas
jurídicas não têm caráter criminal. Não será a empresa que irá prestar serviços
à comunidade, podendo, isso sim, financiar serviços, obras, etc., evidenciando-se
sanção de caráter civil. Também no caso da pessoa jurídica que tem suspensas ou
interditadas suas atividades, bem como a que for proibida de contratar com
poder público, não sofrerá sanção de caráter criminal, mas administrativa. Isso
demonstra que na lei em comento houve inadequado uso do Direito Penal,
seguindo-se a conseqüência necessária: inocuidade.
Há um
outro dado deveras interessante para ser analisado relativamente ao subsistema
penal instituído pela Lei dos Crimes Ambientais. Os crimes em espécie estão
previstos no capítulo V desta Lei, e nota-se que a pena cominada para todos os
tipos é a privativa de liberdade, cumulada, ou não, com multa. Pela
impossibilidade material de execução, sobre a pessoa jurídica, da pena
privativa de liberdade, deverá o juiz substituí-la por uma pena restritiva de
direito, que será a efetivamente executada. A questão que se levanta é a
solução a ser adotada quando do descumprimento da pena restritiva imposta. Nos
termos do Código Penal, quando o condenado descumpre a pena alternativa, haverá
a conversão desta em pena privativa de liberdade, devendo cumprir, desta forma,
o restante da pena. Aplicada esta regra na Lei em análise, voltar-se-á à
situação originária, revelando-se, mais uma vez, a inadequação da punição
criminal do ente coletivo.
CAPÍTULO 4
Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica
1.
Responsabilidade penal da pessoa
jurídica, direito comparado
1.1 Inglaterra
A velha
doutrina inglesa, influenciada pela doutrina da ficção, recusava a
responsabilidade criminal das pessoas coletivas. A partir da Revolução
Industrial e do crescente número de crimes cometidos através das grandes
empresas, a jurisprudência passou a mudar sua orientação começando a aplicar
sanções coletivas, primeiramente em virtude de infrações omissivas e, mais
tarde, também, por atos comissivos.
Alguns
fatores concorreram para tal mudança. Primeiramente uma razão de ordem
processual: através do Sumary Jurisdiction Act de 1879,
superou-se a exigência da presença pessoal do acusado para se fazer representar
em juízo. Além
disso, fez-se necessário impor uma regulamentação à atividade societária,
também no aspecto criminal, para coibir, pragmaticamente, algumas atividades
ilícitas das corporações.
O
quadro evolutivo somente se completou a partir de 1948 com o advento do Criminal
Justice Act, responsável pelo estabelecimento da possibilidade de conversão
das penas privativas de liberdade em penas pecuniárias. Atualmente, no direito
inglês, as pessoas coletivas podem ser punidas por infrações mais leves (misdemeanours)
ou por infrações mais graves (felonies), exceto por aqueles fatos que,
pela própria natureza, não possam ser cometidos por uma corporação. As penas
aplicáveis são pecuniárias, dissolução, apreensão e limitação de atividades.
1.2 Estados Unidos
No
direito norte-americano, o princípio da responsabilidade criminal das
corporações é ainda mais amplo do que na Inglaterra.
Em face
do sistema federado americano, alguns Estados não adotam a orientação dominante
no país, como é o caso do Estado de Indiana. Não obstante tal fato, a regra é a
responsabilidade penal das corporações.
O
direito americano admite a imputação das empresas nas infrações culposas,
quando cometidas por um empregado no exercício de suas funções, mesmo que a
empresa não tenha obtido proveito com o fato delituoso. Além disso, a
corporação também será responsável quando o fato criminoso for cometido a
título de dolo e se praticado por um executivo de nível médio.
A
responsabilidade corporativa é tão ampla que atinge até mesmo os sindicatos,
conforme já decidiu a Corte Suprema dos Estados Unidos, em 05.06.1922(4).
O
Código Criminal Federal de 1988, nos parágrafos 1962 e 1963, também estabelece
penas de multa para os agentes coletivos que, ao lado dos individuais,
participarem direta ou indiretamente de atividades econômicas consideradas
lesivas ao patrimônio público ou associadas ao crime organizado. Multa e
inabilitações são as penas aplicadas pelo cometimento do delito.
Conforme
Sérgio Salomão Shecaria, a tendência atual, no entanto, é de restringir a
aplicação das penas a pessoas coletivas, partindo-se da idéia de que se trata,
certamente, de uma reprovação penal duvidosa sob a ótica da realização da
justiça, segundo exposição de motivos do próprio Código Penal Tipo.
1.3 França
Desde 1o
de março de 1994, com a entrada em vigor do atual Código Penal, a França
juntou-se ao rol dos países que expressamente admitem a responsabilidade penal
das pessoas morais, sempre que o crime for cometido "par leur compte,
par les organes ou représentants" (art. 121,2).
O supra
citado dispositivo legal acolheu amplamente a responsabilidade penas das
corporações, só excluindo de seu alcance as infrações cometidas por
coletividades territoriais (comunas, departamentos, regiões, quando no
exercício de atividades inerentes às funções entendidas como próprias do poder
público) e o próprio Estado. Em contrapartida, todas as pessoas jurídicas são
atingidas, incluindo sindicatos e associações, as sociedades civis e comerciais,
os agrupamentos de interesses econômicos, as fundações clássicas e de empresas.
A idéia
da sociedade coletiva com uma vontade própria, não sendo apenas um mito e se
distinguindo da vontade individual de seus membros foi acolhida no plano
teórico e está disposto no Código Civil. Essa vontade coletiva, concretizada
pela vontade de sua assembléia geral ou de seu conselho de administração,
gerência ou direção, é capaz de cometer ilícitos tanto quanto a pessoa
individual.
1.4 América Latina
Na
América Latina a regra é a incriminação exclusiva da pessoa natural, abrindo-se
exceção para o México e Cuba.
Este
último país tem experiência peculiar
com o Código de Defesa Social de 1936, que partindo das teorias positivistas de
Ferri e estabelecendo como pressuposto da pena a periculosidade e não a
culpabilidade, impunha medidas de segurança às empresas. O art. 16 desse
diploma normativo prevê que:
“as pessoas jurídicas poderão ser
consideradas criminalmente responsáveis nos casos determinados neste código, ou
em lei especiais, em razão das infrações cometidas dentro da própria esfera de
ação das ditas pessoas jurídicas, quando forem levadas a cabo por sua
representação, ou por acordo de seus associados, sem prejuízo da
responsabilidade individual em que houverem incorrido os autores dos fatos
puníveis.”
Por sua
vez, o México, em seu
Código Penal, no art. 11, prevê a possibilidade de, em caso
de crime cometido por algum membro ou representante de pessoa jurídica, desde
que sob amparo da representação social da empresa ou em seu benefício,
decretar-se na sentença a suspensão do agrupamento ou sua dissolução, quando
necessário para a segurança pública. Tal medida, pode ser entendida, de acordo
com os ensinamentos de Shecaria, "como uma medida de caráter
administrativo complementar, e não como uma plena responsabilidade da pessoa
coletiva."
1.5 Alemanha
Pela
influência do direito alemão na moderna dogmática penal, mister se faz tecer
maiores comentários acerca deste ordenamento jurídico.
Na
Alemanha, as pessoas coletivas não podem ser objeto de sanções do tipo penal.
Nem o Código Penal vigente, tampouco o Direito Penal Alemão como um todo
conhecem penas que possam ser aplicadas às empresas. Vigora, pois, a regra societas
delinquere non potest. As pessoas jurídicas, entretanto, podem ser
atingidas pelo confisco especial dos ganhos obtidos com o delito, assim como
pela perda dos producta et instrumenta sceleris (§§ 73 e 74, do Código
Penal).
Como,
para eles, as pessoas jurídicas atuam exclusivamente por intermédio de seus
órgãos, às mesmas podem somente ser impostas sanções pela via do chamado
direito penal administrativo ou contravenção à ordem. Estas são infrações de
menor gravidade. Sua sanção não é a multa penal (Geldstrafe), mas sim
uma multa administrativa (Geldbusse), aplicada para as infrações de
trânsito e as econômicas.
O
insigne penalista Luiz Regis Prado(10) noticia que o art. 30, da OWIG (Gesetz
über Ordenungswidrigkeiten), de 1975, prevê a imposição de multa
contravencional como sanção acessória à pessoa jurídica quando o autor, dotado
de certa representatividade, praticar uma contravenção ou um delito, sempre e
quando tenha conexão com a atividade da empresa.
Ainda conforme o
mencionado Professor, o art. 130, da mesma lei, prescreve:
"Quem, como proprietário ou
titular de uma empresa, dolosa ou culposamente, omite-se em adotar as medidas
de vigilância necessárias para evitar a realização de infrações cominadas com
pena ou multa administrativa e vinculadas à atividade da empresa, será punível
por contravenção, quando se praticar uma contravenção ou delito, no caso me que
o exercício da vigilância devida pudesse evitar a contravenção ou delito".
Essa
disposição legal cria um dever de vigilância que dá origem a tipos de omissão
pura.
Para
Shecaria, a justificativa para adoção de tal sistema se firma na idéia segundo
a qual não se pode aplicar uma sanção de natureza penal às empresas em face da
inexistência de reprovação ético-social de uma coletividade. As multas, em tais
casos, são desprovidas do significado social de reprovação e, portanto,
valorativamente neutras.
Além
das penas pecuniárias, os arts. 8o e 10, da lei sobre delinquência
econômica, prevêem o confisco à pessoa jurídica de seus bens, dentre outras
medidas. Apreensão de bens, restituição das vantagens e encerramento das
empresas também são medidas encontradas para reprovação das empresas no direito
alemão.
No
processo vigora o princípio da oportunidade e não o da legalidade. A acusação é
exercida pela autoridade administrativa e não pelo Ministério Público. Da decisão
da autoridade administrativa cabe recurso para o tribunal administrativo
regional.
1.6 Itália
A
evolução da responsabilidade penal das pessoas coletivas na Itália tem sido
delimitada pelo princípio constitucional da personalidade da responsabilidade
penal, contido no art. 27 da Constituição, e sobejamente consagrado pela Corte
Constitucional. Entretanto, o art. 197 do Código Penal prevê a responsabilidade
subsidiária da empresa em relação à sanção pecuniária, porém, tal
responsabilidade é de natureza civil.
Foi
introduzido, neste país, em 1981, o Direito Penal Administrativo. E, a partir
de 1990, foram criadas sanções administrativas, quase-penais, contra as
empresas no campo da concorrência, do mercado de valores mobiliários e de
audiovisuais.
1.7 Espanha
No
Código Penal espanhol de 1995,
a responsabilidade individual continua sendo a única
fonte, tanto da pena, quanto da medida de segurança.
De um
modo geral, o Título VI, do Livro I, no art. 129, define medidas que afetam as
pessoas jurídicas, qualificando-as, porém, como consequências acessórias de
ações individuais de pessoas naturais que integram a pessoa jurídica.
A
repulsa, nas palavras de João Marcello de Araújo Júnior(13), que alguns
juristas espanhóis sentem pela idéia de uma responsabilidade penal das empresas
levou o legislador a criar, no art. 31, do Código Penal, uma figura tortuosa de
responsabilidade por fato de outrem, assim redigida:
"El que actúe como administrador de hecho o de derecho de una
persona jurídica, o en nombre o representación legal o voluntaria de outro,
responderá personalemte, aunque non concurran en el las condiciones, cualidades
o relaciones que la correspondiente figura de delito o falta requiera para
poder ser sujeto activo del misto, si tales circunstancias se dan en la empresa
o persona en cuyo nombre o representación obre."
Ainda
segundo o supra citado autor, esse dispositivo legal não passa de um
subterfúgio para excluir a responsabilidade penal da empresa, revelando o
caráter pessoal da responsabilidade penal na Espanha. Para ele, o Código Penal
espanhol preferiu consagrar uma forma de responsabilidade objetiva a admitir a
responsabilidade da empresa.
2. Responsabilidade penal da pessoa
jurídica na Constituição Federal de 1988
Exista
muita controvérsia na doutrina nacional sobre a questão no âmbito
constitucional. Alguns entendem que continua em vigor o princípio societas
delinquere non potest, não revogado, mas ratificado pela Carta de 1988.
Outros, ao contrário, sustentam que efetivamente a mais recente Constituição
brasileira desejou inovar e se adequar à tendência universal no sentido de
responsabilizar penalmente a pessoa jurídica.
A
Constituição de 1988, sobre o tema, declara:
"A lei, sem prejuízo da
responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a
responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza,
nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia
popular" (art. 173, § 5o).
"As condutas e atividades
consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas
ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da
obrigação de reparar os danos causados"(art. 225, § 3o).
Fausto
Martin de Sanctis, ao defender seu ponto de vista, expõe que:
"O legislador constitucional, atento
às novas e complexas formas de manifestações sociais, mormente no que toca à
criminalidade praticada sob o escudo das pessoas jurídicas, foi ao encontro da
tendência universal de responsabilização criminal. Previu, nos dispositivos
citados, a responsabilidade penal dos entes coletivos nos delitos praticados
contra ordem econômica e financeira e contra a economia popular, bem como
contra o meio ambiente.”.
Além
dos penalistas, grande parte dos constitucionalistas, também, reconhece a
responsabilidade da empresa na Carta Política de 1988.
José
Afonso da Silva defende que o disposto no art. 173, § 3o, prevê a
possibilidade de responsabilização das pessoas jurídicas, independentemente de
seus dirigentes, sujeitando-os às punições compatíveis com sua natureza, nos
atos praticados contra a ordem econômica, tendo como um dos seus princípios a
defesa do meio ambiente.
Tanto
para o citado autor, como para Shecaira, os dois dispositivos da Carta Magna
invocados no início deste capítulo têm entre si uma articulação orgânica, que
impedem ser examinados separadamente, por estarem no âmbito do mesmo contexto.
Para
José Carlos de Oliveira Robaldo[16],
a responsabilidade penal das pessoas coletivas peca por dois motivos: primeiro
porque fere o Direito Penal mínimo, posto que está, se atribuindo ao Direito
Penal uma tarefa que não é sua; segundo porque o Direito Penal se fundamenta na
culpabilidade, cuja conduta, pedra angular da teoria geral do delito, somente é
atribuível ao homem.
Luiz
Vicente Cernicchiaro, por seu turno, entende que os arts. 173, § 5o
e 225, § 3o, devem ser interpretados teleologicamente e considerados
dentre de um contexto sistêmico maior, sob pena de se perder a congruência e
visão de conjunto em relação a outros dispositivos constitucionais. Para ele,
ao menos dois princípios básicos do direito penal, insertos na Constituição,
seriam atingidos se houvesse a responsabilidade penal da empresa, quais sejam,
o princípio da culpabilidade e o da responsabilidade pessoal;
"haveria, pois, ofensa à
idéia de que sem culpabilidade não existe pena, dogma de segurança individual,
garantido pelo sistema penal brasileiro e haurido do Iluminismo; além disso, a
pena passaria da pessoa do condenado, atingindo terceiros que não houvessem praticado
qualquer conduta delituosa, ou que nem mesmo tivesse dado alguma contribuição
nesse sentido."
Com
efeito, pensamos que uma sociedade comercial e um homem são entes distintos em
sua estrutura, haja vista que a conduta humana não tem seu equivalente no ato
jurídico da pessoa jurídica, sendo a imputabilidade jurídico-penal uma
qualidade inerente aos seres humanos.
Ora, a
capacidade de ação, de culpabilidade e de pena, que analisamos en passant,
exige a presença de uma vontade, entendida como faculdade psíquica da pessoa
individual, inexistente na pessoa jurídica, mero ente ao qual o direito atribui
capacidade para outros fins distintos dos penais.
Além, do mais
a condenação de uma pessoa jurídica poderia, assim, atingir pessoas inocentes
como os sócios minoritários (inclusive aqueles que votaram, expressamente,
contra a decisão), os acionistas que não tiveram participação na ação
delituosa, e todas as pessoas físicas que, indiretamente, seriam atingidas pela
sentença condenatória.
E, por fim, na seara sócio-jurídica,
avulta-se a crítica que diz respeito à impossibilidade de fazer uma pessoa
jurídica arrepender-se, posto que ela é desprovida de vontade. Pela mesma
razão, não poderia ela ser intimidada ou mesmo reeducada.
Neste
sentido e entendimento, tem julgado nossos tribunais, vejamos:
PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. CRIMES CONTRA O MEIO AMBIENTE.
DENÚNCIA REJEITADA PELO E. TRIBUNAL A QUO. SISTEMA OU TEORIA DA DUPLA IMPUTAÇÃO.
Admite-se a responsabilidade penal da pessoa jurídica em crimes ambientais desde que haja a imputação simultânea do ente moral e da pessoa física que atua em seu nome ou em seu benefício, uma vez que "não se pode compreender a responsabilização do ente moral dissociada da atuação de uma pessoa física, que age com elemento subjetivo próprio" cf. Resp nº 564960/SC, 5ª Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJ de 13/06/2005 (Precedentes). Recurso especial provido.
PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CRIMES CONTRA O MEIO AMBIENTE. DENÚNCIA. INÉPCIA. SISTEMA OU TEORIA DA DUPLA IMPUTAÇÃO. NULIDADE DA CITAÇÃO. PLEITO PREJUDICADO.
I - Admite-se a responsabilidade penal da pessoa jurídica em crimes ambientais desde que haja a imputação simultânea do ente moral e da pessoa física que atua em seu nome ou em seu benefício, uma vez que "não se pode compreender a responsabilização do ente moral dissociada da atuação de uma pessoa física, que age com elemento subjetivo próprio" cf. Resp nº 564960/SC, 5ª Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJ de 13/06/2005 (Precedentes).
II - No caso em tela, o delito foi imputado tão-somente à pessoa jurídica, não descrevendo a denúncia a participação de pessoa física que teria atuado em seu nome ou proveito, inviabilizando, assim, a instauração da persecutio criminis in iudicio (Precedentes).
III - Com o trancamento da ação penal, em razão da inépcia da denúncia, resta prejudicado o pedido referente à nulidade da citação.
Recurso provido.
PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. CRIMES CONTRA O MEIO AMBIENTE. DENÚNCIA INÉPCIA. RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA.
Na dogmática penal a responsabilidade se fundamenta em ações atribuídas às pessoas físicas. Dessarte a prática de uma infração penal pressupõe necessariamente uma conduta humana. Logo, a imputação penal à pessoas jurídicas, frise-se carecedoras de capacidade de ação, bem como de culpabilidade, é inviável em razão da impossibilidade de praticarem um injusto penal. (Precedentes do Pretório Excelso e desta Corte). Recurso desprovido.
Considerações Finais
Como
visto, a Constituição Federal prevê que as pessoas jurídicas podem ser
penalizadas criminalmente, sendo editada a Lei nº 9.605/98, para regulamentar
tal dispositivo. Trata-se de uma tendência mundial que atingiu o direito
brasileiro, pois não pode persistir a impunidade daqueles que, aproveitando-se
de um ente coletivo, praticam crimes. Em síntese, meio ambiente é um bem
jurídico tutelável pelo Direito Penal.
A
problemática que se estabeleceu com o advento da citada lei é a incompatibilidade
de diversos dispositivos com o sistema penal vigente, ou seja, o legislador
brasileiro inseriu a responsabilidade penal da pessoa jurídica no ordenamento
jurídico sem se preocupar com a necessária adequação com os institutos vigentes
e que são incompatíveis, ensejando, como demonstrado, inúmeras críticas, muitas
das quais insuperáveis, sendo que as mais contundentes referem-se à
incompatibilidade da nova criminalização com o princípio da culpabilidade, bem
como à aplicação de penas à pessoa jurídica.
Entende-se
que, subscrevendo o entendimento de respeitáveis doutrinadores, o meio ambiente
ecologicamente equilibrado é um bem jurídico passível de tutela penal e, à
medida que pessoas jurídicas atentam contra este equilíbrio, devem também ser
penalizadas, admitindo-se, inclusive, punições de índole criminal.
Entretanto,
não há como deixar de reconhecer a total falta de adequação desta
criminalização com o sistema penal vigente no Direito pátrio. O Direito Penal,
inserto na Constituição Federal e no Código Penal, com efeito, prevê princípios
e institutos cuja aplicabilidade só é viável para a pessoa física,
ressaltando-se o princípio da culpabilidade, da personalidade das penas, a
individualização das sanções penais.
Há
necessidade de um sistema próprio que viabilizasse a aplicação de sanções
criminais à pessoa jurídica, a exemplo do trabalho legislativo feito na França
para, antes de adotar a responsabilidade coletiva, compatibilizar o ordenamento
jurídico penal com a inovação.
Por todos os
aspectos destacados, evidencia-se que a aplicabilidade da Lei dos Crimes
Ambientais, no tocante às pessoas jurídicas, está comprometida, esperando-se
que o legislador penal, empenhe-se na criação de um subsistema próprio para a
aplicação plena e efetiva desta Lei. Enquanto isso não ocorrer, ela integra o
infindável rol de leis penais sem efetividade, que apenas alimentam a
impunidade.
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(Legislação Brasileira).
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, 12º edição, São Paulo, Ed. Saraiva, 2006
(Legislação Brasileira).
[1] Mirabete, Julio Fabbrini, Manual de
Direito Penal, Parte Geral, São Paulo, Ed. Atlas, 2002, Vol. 1, pág. 95.
[2] Teles, Ney Moura, Direito Penal, Parte
Geral, São Paulo, Ed. Atlas, 2001, Vol. 1, pág. 133.
[3] Teles, Ney Moura, Direito Penal, Parte
Geral, São Paulo, Ed. Atlas, 2001, Vol. 1, pág. 134.
[4] Teles, Ney Moura, Direito Penal, Parte
Geral, São Paulo, Ed. Atlas, 2001, Vol. 1, pág. 134.
[5] Teles, Ney Moura, Direito Penal, Parte
Geral, São Paulo, Ed. Atlas, 2001, Vol. 1, pág. 134.
[6] Teles, Ney Moura, Direito Penal, Parte
Geral, São Paulo, Ed. Atlas, 2001, Vol. 1, pág. 134.
[7] Mirabete, Julio Fabbrini, Manual de Direito
Penal, Parte Geral, São Paulo, Ed. Atlas, 2002, Vol. 1, pág. 96.
[8] Jesus, Damásio E. de, Direito Penal,
São Paulo, Ed. Saraiva, 2002, Vol. 1, pág. 151.
[9] Mirabete, Julio Fabbrini, Manual de
Direito Penal, Parte Geral, São Paulo, Ed. Atlas, 2002, Vol. 1, pág. 102.
[10] Mirabete, Julio Fabbrini, Manual de
Direito Penal, Parte Geral, São Paulo, Ed. Atlas, 2002, Vol. 1, pág. 112.
[11] Mirabete, Julio Fabbrini, Manual de
Direito Penal, Parte Geral, São Paulo, Ed. Atlas, 2002, Vol. 1, pág. 173.
[12] Monteiro, Washington de Barros, Curso
de Direito Civil, São Paulo, Ed. Saraiva, 1997, Vol. 01, pág. 97.
[13] Monteiro, Washington de Barros, Curso
de Direito Civil, São Paulo, Ed. Saraiva, 1997, Vol. 01, pág. 102.
[14]
Sob a ótica etimológica, o termo ambiente vem do verbo ambire, que significa ir
a volta, ou tudo que vaia volta. Não raro o termo meio é usado sem a palavra
ambiente, mas contemplando igual significado.
[15]
Visão biocêntrica, que considera o homem como integrado ao meio ambiente.
Contrapõe-se a visão antropocêntrica, pela qual o homem seria algo externo à
natureza. Marcelo Rodrigues, escreve que a única forma de o homem salvar a si mesmo, é a partir de um visão
biocêntrica do meio ambiente.
[16] ROBALDO,
José Carlos de Oliveira,
A Responsabilidade Penal da Pessoa Jurídica:
Direito Penal na Contramão da História, in
Coleção Temas Atuais de Direito Criminal, v. 2, São Paulo : Revistas dos
Tribunais, 1999, p. 100.
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